FALTA MERDA
FALTA MERDA
Dizem que no meio do mato de uma
cidadezinha do interior tinha um homem muito trabalhador, mas muito ignorante.
Só tratava a mulher e os filhos com pontapés e palavras ásperas. Um cavalo
batizado.
- Bicho bruto! É por isso que não
gosto dele e não dou dia de serviço alugado a ele. Que trabalhe só, pra deixar
de ser animal e carne de tetéu! Assim alguém comentava.
- Se eu fosse a mulher dele, botava
um par de chifres, arrumava meus trapos e dava um chute no pé da bunda dele.
Que fosse atazanar outra. É o que ele merece!
Dizia uma vizinha, na fofoca com as
amigas. Um outro mais lido comentava:
- Não vai fazer nada na vida. Vai
viver sozinho e trabalhar só pra comer. Uma andorinha só não faz verão!
Este era o sentimento de todos que
conheciam ele. E diziam que ele queria todo mundo perfeito, sem esquecer nada,
sem errar nada, sem precisar mandar fazer isto ou aquilo, tinha de saber o que
fazer.
- Não são burros!... Se é pra tá
mandando o que fazer, prefiro fazer só! Nasci só! Eu dou conta do recado
sozinho! Assim ele pensava.
Sua mulher sofria por ela e pelos
filhos. Por mais que procurasse agradar ou não deixar os filhos bagunçarem
nada, não conseguia satisfazer suas brutalidades. Sempre tava faltando alguma
coisa. Mesmo sem ele dizer o que queria, procurava adivinhar os pensamentos
dele, mas não conseguia tudo. Ai dela se ele acordasse e o café moído não
tivesse pronto.
- Só quer saber de dormir, diabo!
Descompunha.
Se ele botasse os pés na calçada de barro
batido e o almoço não tivesse pronto, botava o maior boneco.
Num certo dia de chuva, em meio a
relâmpagos e trovoadas, ajoelhou-se, rezou muito e pediu ao anjo da guarda pra
iluminar uma solução praquele pesadelo. Naquele momento, procurou não esquecer
nada. Pensou, fez-se ele, tentou ensaiar pra descobrir o que ele mais devia
pedir. Fez tudo que se podia imaginar.
Já bem pertinho dele chegar - já
dava pra avistar debaixo do pé de burdão do terreiro - uma galinha voou em cima
da mesa posta pro almoço e fez cocô. Ele riscou na soleira da porta, não dava
mais tempo pra limpar a mesa. Ela pegou rapidinho um prato e cobriu a merda pra
ele não ver. Ele sentou-se, olhou tudo e não viu o que reclamar. Resmungou, sem
dar pra entender o que dizia. Aí ela, cortando prego, cautelosa e carinhosa,
perguntou:
- Mas Alfredo, eu faço tudo que
posso pra lhe agradar e não faltar nada pra você, o que tá faltando, pelo amor
de Deus?
Como ele não achava o que dizer,
bradou, bem alto e grosseiramente:
- Merda!
De repente, ela levantou o prato que
cobria a merda que a galinha tinha feito na mesa e disse:
- Pronto, não falta mais nada!
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